domingo, 8 de agosto de 2010

Basta você me bastar

Minha doce aflição,

Não precisa me chamar de querido. Não precisa me chamar de “meu”. Nem precisa me chamar. Eu te ouço. Isso já me basta. Ouvir o seu inconsciente me chamar me basta. Ouvir o silêncio distante – sabendo que esse silêncio é seu – me basta. Ouvir suas perguntas – sabendo que eu não tenho as respostas – me basta. Ouvir você não dizer nada, também me basta. E mesmo que, um dia, você resolva nunca mais me chamar eu estarei satisfeito. Você me basta. Pensar em você me basta. Pensar em você me mata. Você me mata.

Basta você esboçar um sorriso qualquer – mesmo irônico, pouco importa - para me deixar um pouco menos triste. Fique feliz por isso. Basta você olhar pela janela e me avisar que está chovendo – eu acredito. Nem me preocupo em abrir a minha para confirmar. Acredito em você. Basta você levantar de madrugada, sem saber onde olhar, sem saber me procurar, sem saber onde me achar, que eu já fico bem só de imaginar você perdida tentando me encontrar.
Basta você começar a fumar, mesmo sabendo que o cigarro não te faz bem, que eu fico com ciúmes – ciúmes do seu cigarro. Eu sei que é quase ridículo sentir ciúmes de algo que não te faz bem – mas eu sinto. Quero ser esse cigarro. Esse cigarro que você fuma pela manhã e deixa pela metade durante o dia para terminá-lo delicadamente à noite, entre seus lábios. Quero ser esse cigarro grudado nos teus dedos, firme, com a certeza que você não vai me largar tão cedo e que mais tarde vou terminar morrendo inteiro na sua boca. Mesmo que você me apague depois, com a maior calma do mundo, como se não tivesse lhe proporcionado nada. Você me mata. E isso me basta. Quero ser esse cigarro que aparece nas tuas fotografias em preto e branco. Esse cigarro que libera a fumaça. A fumaça por trás da qual você se esconde. A fumaça por trás da qual você esconde sorrisos, bondade. A fumaça por trás da qual você esconde uma menina, uma menina que sonha, uma menina que dança, uma menina que some. Pensar em você me basta. Pensar em você me mata. Você me mata. E quando eu morro, eu caio no meu chão. Um chão onde existem apenas migalhas de pães mal-comidos, sobras de mulheres mal-comidas, restos de amores polêmico e um tapete colorido. Um chão onde existem poemas inacabados que nunca serão acabados, retratos envelhecidos que nunca serão renovados, sonhos esquecidos que nunca serão recordados, pedaços de noites desperdiçadas que nunca serão religados, alguns amores platônicos e você descolorida. Até descolorida você me basta. E isso me mata.

Minha doce aflição, eu vivo dizendo que você me mata e você morre calada não dizendo nada. Por quê?

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